Logo chegava a
conclusão que nunca mudaria.
Para não se
entristecer cantava para espantar os maus pensamentos.
-“Que falta
me faz de um bem!
Que falta me faz
de um xodó!
Mas como eu não
tenho ninguém...
Eu levo a vida
assim, tão só!
Mas eu só quero
um amor!
Que acabe o meu
sofrer!
Um xodó pra
mim...
Com teu jeito,
assim...
Que alegre o meu
viver!”
E repetia as
duas estrofes inúmeras vezes, pois não sabia o resto da música. Cantava com o
coração, com alegria, sentindo que apesar de sofrer tanto era uma garota de
coração de carne e sentia amor. Um amor sem dono e sem motivo, apenas amor.
Logo, alguns animais curiosos apareciam para ouvir sua cantoria, apesar de sua
voz não ser das mais doces ou suaves.
Mas era sincera
e natural.
A voz de um
coração de menina.
Dois calangos,
lagartos de pele escura, fitaram Branca puxar água do poço artesiano, estavam no
alto de uma pedra e ouviam atentamente a menina. Atrás dela, seu fiel
escudeiro, corria levantando poeira atrás de dois gordos preás, espécimes
semelhantes a ratos encontrados na caatinga. Um cachorro magro, sem raça, de
pelos amarelados como o solo e dentes alvos de tanto roer ossos que encontrava
pelo caminho que Branca seguia. Esse é seu escudeiro e fiel confidente.
Tinha a altura
da cintura da menina.
Apesar de
ossudo, o cachorro era valente e protegia Branca sempre que achava que sua
amiga estava em apuros. Foi à maneira que encontrou de retribuir o bem que a
menina fez a ele, depois de muito suplicar a Rainha para não matá-lo. Branca o
batizou de Lampião.
O cachorro fazia
jus ao nome.
Além de valente,
era feroz e bom caçador. Raramente faltava carne de algum animal quando Lampião
ia caçar.
-“Que falta
me faz de um bem!
Que falta me faz
de um xodó!
Mas como eu não
tenho ninguém...
Eu levo a vida
assim, tão só! –
e puxava com as forças que lhe eram cabíveis um balde cheio de água.
Mas eu só quero
um amor!
Que acabe o meu
sofrer!
Um xodó pra
mim...
Com teu jeito,
assim...
Que alegre o meu
viver!”-
ela cantava sem se importar.
Uma gigante
nuvem de poeira se formava atrás de Branca. Os calangos fugiram ao perceber o
perigo, mas Branca não percebeu. Estava tranquila e concentrada em puxar os
baldes de água, cantarolando uma das poucas músicas que aprendera no velho
rádio. Lampião notou a poeira chegando cada vez mais perto de sua amiga, deixou
a caçada para um momento mais oportuno e saiu em disparada.
Seu corpo magro
e esguio lhe era útil quando precisava correr rápido e sem perder tempo. Logo
estava entre Branca e a nuvem de poeira. Começou a latir como manda o figurino,
avisando a amiga do perigo. Branca vira-se e vê um corpo de aproximando dela.
Seu movimento foi tão rápido quando a carreira que Lampião tomara.
Segurou o balde
com firmeza e atingiu na cabeça do que parecia ser um homem sobre um animal. O
homem caiu no solo e o animal, que é um jumento, relinchou de susto. Lampião
continuou a latir.
A confusão
estava armada.
Continua na próxima parte.